segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Ahmés-Nefertari

"Nascida do deus-lua, a mais bela das mulheres". Soberana das Duas Terras, "mãe real", foi também uma espécie de faraó – sobreviveu ao marido (Ahmés), depois de ser associado a todos os grandes atos do seu reinado; foi regente do reino durante a infância de Amenhotep I (1551-1524 aC) e morreu velha, no início do reinado de Tutmósis I (1524-1518 aC), depois de assistir à sua coroação. Foi uma dessas extraordinárias rainhas do Egito.

Nasceu provavelmente em Tebas e lá foi criada; o desenvolvimento religioso que ela deu a essa região demonstra o amor que lhe dedicava. Exerceu o poder durante muitos anos, quando Amenhotep I era muito jovem para assumir o cargo. Foi também autora de notáveis inovações cujas consequências seriam ainda perceptíveis vários séculos após o seu desaparecimento, quando a dinastia das Divinas Adoradoras reinava em Tebas.


Numa estela em fragmentos, foi encontrado um texto que revelou que Ahmés-Nefertari tinha o título de "segundo servidor do deus" na hierarquia do templo de Karnak e renunciou. O rei oferece em troca os meios materiais necessários para criar uma nova instituição religiosa e ecomômica: a da "esposa do deus" de que a rainha se tornou a fundadora. Passou a dispor de bens móveis e imóveis destinados a constituir o domínio da esposa do deus:
  • terras, ouro, prata, bronze, vestes, trigo e unguentos.

O rei mandou construir uma morada para a esposa do deus, e um registro foi selado a seu favor. Nas suas funções, Ahmés-Nefertari usava um vestido estreito até os calcanhares, apertado na cintura e com alças que cobriam parcialmente os seios, um vestido clássico como os da sacerdotisas do Antigo Império; uma peruca curta, cingida por um aro. Usava duas altas plumas que completavam o toucado tradicional das rainhas e que eram "os despojos do abutre", símbolo da função materna no seu aspecto espiritual.

– Chefiou um colégio de sacerdotisas que a ajudariam a exercer a sua principal função:
  • manter, com o seu amor, a energia do deus Amon, a fim de que o amor divino alimentasse o Egito.
A morte da grande rainha no início do reinado de Tutmósis I cerca de 1524 aC, tinha marcado seu tempo, e sua memória nunca se apagou. Cerca de 70 escaravelhos ostentam o seu nome, estelas amovíveis e estatuetas com a sua efígie, inúmeros objetos rituais como os sistros que lhe são dedicados, a sua presença em cerca de 50 cenas pintadas nos túmulos tebanos. Sua múmia foi recolhida num enorme sarcófago depositado num túmulo a oeste de Tebas, em Dra Abu el-Neggah.

Foi considerada a santa padoreira da necrópole tebana e durante várias décadas gozou de grande popularidade. Seu templo foi edificado perto de seu túmulo, "aquele cuja localização é estável (menset)", na orla das terras cultivadas. Esse tipo de construção estava normalmente reservado aos faraós, sendo conhecidas poucas exceções. Ao longo da história do Egito, algumas mulheres colaboraram nas escritas dos textos utilizados nas liturgias, Ahmés-Nefertari foi certamente um desses autores sagrados.

– Várias representações da grande rainha espantaram os observadores:
  1. não havia dúvida de que tinha a pele negra
  2. seria de origem negra
A descoberta de sua múmia, retirada do seu túmulo de Dra Abu el-Neggah e abrigada no esconderijo de Deir el-Bahari depois de uma onda de assaltos aos túmulos reais no reinado dos últimos ramessidas, ofereceu uma certeza:
  • ela morrera velha e tinha a pele branca;
em contato com o ar e por falta de precauções, o corpo decompôs. Por que razão certas estátuas da rainha são em madeira betumada, e por tanto da cor negra? No simbolismo egípcio, ela encarna a ideia da regeneração, do processo alquímico pelo qual a alma deve passar para reviver no Além.

Ahmés-Nefertari prefigura assim as Virgens negras, outrora numerosas nas catedrais e igrejas do Ocidente; remotas figuras de Ísis segurando Hórus, o menino-deus, eram também descendentes de uma rainha do Egito, tornada deusa da ressurreição.

Origem: 'As Egípcias' de Christian Jacq

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Egito

Duas grandes forças: o rio Nilo e o deserto do Saara, configuraram uma das civilizações mais duradoras do mundo. Todos os anos o rio inundava suas margens e depositava uma camada de terra fértil em sua planície aluvial. Os egípcios chamavam a região de Kemet, "terra negra". Esse ciclo fazia prosperar as plantações, abarrotava os celeiros reais e sustentava uma teocracia – encabeçada por um rei de ascendência divina, ou faraó – cujos conceitos básicos se mantiveram inalterados por mais de 3 mil anos. O deserto, por sua vez, atuava como barreira natural, protegendo o Egito das invasões de exércitos e idéias que alteraram  profundamente outras sociedades antigas. O clima seco preservou artefatos como o Grande Papiro Harris, revelando detalhes de uma cultura que ainda hoje suscita admiração.

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