O Alto Egito permanece livre, e os hicsos não conseguem possuí-lo. Da 13ª dinastia ao final da 17ª, o país encontra-se dividido em dois. Alguns egípcios colaboraram com os ocupantes, outros recusaram a sua presença. Para uns os hicsos foram bárbaros cruéis e destruidores, para outros, dobraram-se ao modo de vida egípcio, na esperança de se imporem com o tempo. Mas não se tornaram populares.
Pouco antes de 1570 a.C , a situação modificou-se quando uma mulher excepcional, Iah-Hotep, deixou de tolerar essa ocupação estrangeira que arruinava o Egito e decidiu fazer tudo para libertá-lo.
– Uma guerra inspirada pelo deus-lua
Filha do rei Taa I e da rainha Tetisheri, provém de Tebas, pequena cidade do sul do Egito. Esposa do rei Sequenenrê – que assume a chefia do exército de libertação e se lança ao ataque dos hicsos. Tiveram dois filhos: Kamósis e Ahmósis. Iah-Hotep tem um nome significativo: "O deus-lua (Iah) está em paz". Em antigo egípcio, a palavra "lua" é masculina: é o "Sol da noite", cheio de magia e muitas vezes comparado a um touro. O nome da rainha anuncia todo um programa político: primeiro a guerra (Iah), depois a paz (hotep), uma vez conseguida a vitória.
Viúva e com a perda do filho Kamosis, ambos na luta contra os hicsos, cabe a Ian-Hotep e seu segundo filho Ahmósis prosseguir na ação guerreira.
– A libertação do Egito
Quando atingiu a idade de mandar e de combater, Ahmósis partiu para o norte, para apoderar-se de Avaris e expulsar definitivamente os hicsos do Egito. Uma estela, erigida pelo rei no interior de Kanark, mostra o texto como Iah-Hotep se comportou como um verdadeiro faraó:
Dirigi louvores à dama das margens das terras distantes, cujo nome é exaltado em todos os países estrangeiros, ela que governa multidões, ela que cuida do Egito com sabedoria, que se preocupou com o seu exército, que velou sobre ele, que fez regressar os fugitivos e reuniu os dissidentes, que pacificou o Alto Egito e submeteu os rebeldes.
O seu segundo filho – Ahmósis – acaba de libertar a totalidade do território egípcio até reunificar as Duas Terras, tornando-se o primeiro faraó de uma nova dinastia: a 18ª dinastia.
– O nascimento de uma capital
Mênfis, até então foi a grande cidade dos faraós, a "balança das Duas Terras", na junção do Delta e do Vale do Nilo, fundada por Djeser.
Mas a nova dinastia era originária de Tebas, e esta se tornou a nova capital de um Egito livre. Tebas (Uaset) – "a cidade do cetro uas (aquele que as deusas tem)", nome sagrado de Tebas. A "cidade das cem portas" que maravilhou Homero.
– A rainha condecorada como um general
Mulher enérgica e vigorosa, morreu octogenária, venerada pela corte e pelo povo. Fora a libertadora, a heroína que dera ao exército a coragem necessária para expulsar os ocupantes. A rainha foi inumada num túmulo de Dra Abu el-Neggah, um setor ocidental de Tebas.
O egiptólogo francês Auguste Mariette escavou a sepultura em 1859 e descobriu um tesouro composto de jóias de bela confecção:
- uma pulseira em ouro maciça revestida de lápis-lazúli, a qual proclamava o reconhecimento de Ahmósis como faraó
- uma pulseira de pérolas enfiadas em ouro e formada por faixas de ouro, lápis-lazúli, cornalina e turquesa
Três objetos surpreendentes sublinhavam a ação da guerreira da grande rainha:
- um punhal com lâmina de ouro
- um machado com cabo de cedro laminado a ouro
- três moscas de ouro (atribuídos como recompensa a generais que se destacam em combate)
Nenhuma outra rainha do Egito recebeu essa condecoração militar, a mais alta que o faraó concedia a um valente. Ahmósis reconhecia assim que a inspiradora da guerra da libertação era Iah-Hotep. A rainha havia realizado o seu projeto de utilizar a força do deus-lua em prol da luta vitoriosa contra os hicsos e restabelecer a paz.
Origem: 'As Egípcias' de Christian Jacq
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